Vida que segue... já que estou com esse jogo na cabeça, desenvolvi uma análise, que compartilho com vocês, amigos e amigas. Sugiro ler quando a cabeça estiver mais fria. Ou não... cada qual com seu cada qual, e vamos em frente.
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Conheço um tanto de gerenciamento de crises, já trabalhei com isso em corporações, já dei aula de introdução ao tema e algumas palestras. Faz parte do meu ofício.
Há alguns poucos axiomas em gerenciamento de crises. Um deles diz que toda crise dá avisos, alertas prévios que sinalizam que a crise irá acontecer. E, muitas vezes, as crises acontecem porque esses avisos foram ignorados ou não foram levados a sério, foram mal avaliados. Se são percebidos e bem interpretados em tempo hábil, os avisos costumam evitar ou amenizar uma crise.
Analisemos agora a vergonhosa derrota do Brasil para a Alemanha. Eu percebo alguns avisos prévios:
• Hulk não rendeu o suficiente no ataque desde o primeiro jogo. Após duas partidas, já se percebia que ele é raçudo, comprometido, corre atrás, tem vigor e velocidade, mas é tecnicamente limitado, tem pouca visão de jogo, não consegue dar dribles, acaba contribuindo pouco para o ataque, especialmente por falta de técnica. Nada foi feito, em nenhum momento a comissão técnica deu sinais de que o substituiria por outro jogador. Em todos os jogos começou como titular e jogou a maior parte do tempo, sendo substituído no meio do segundo tempo.
• Oscar fez uma ótima primeira partida, mas desapareceu em campo em todos os jogos seguintes. Depois do terceiro jogo, era visível que ele não estava funcionando, seja porque não jogava bem, seja porque o esquema não funcionava. Mas nada foi feito, ele começou todas as partidas como titular e poucas vezes foi substituído no segundo tempo.
• O meio de campo não funcionava. O único que criava jogadas para o ataque era Neymar, que por sua vez tem o pecado de ser muito individualista, de querer resolver tudo sozinho. Paulinho jogou mal duas partidas e foi substituído. Fernandinho entrou e melhorou muito. Paulinho teve nova oportunidade com a suspensão de Luiz Gustavo e jogou bem contra a Colômbia. Aí, Luiz Gustavo voltou e Felipão jogou Paulinho para a reserva, entrando com ele no segundo tempo. Mas, de maneira geral, ao longo de cinco jogos antes da Alemanha, o meio de campo foi bem ruim. E nada foi feito pela Comissão Técnica que mudasse efetivamente o meio de campo, com resultados.
• Fred ficou isolado no ataque, nem o meio de campo, nem Neymar conseguiam fazer a bola chegar até ele. E ele foi achincalhado nas redes sociais e por parte da imprensa. Foi criticado também por não correr atrás da bola. De um jeito ou de outro, um atacante goleador como ele não conseguir receber a bola e não fazer gols é um alerta mais do que claro de que tem alguma coisa errada. Mas, nada foi feito.
• A seleção, depois do terceiro jogo, claramente era Neymar e mais 10. Ora, isso é uma grande fraqueza. No nosso melhor jogo, contra a Colômbia, Neymar jogou mal, é verdade. Mas nos anteriores, se não fosse ele, talvez nem tivéssemos chegado às Quartas de Final. Era preciso desenvolver o restante do time para equilibrar a atuação de Neymar, fazer com que o time não ficasse tão dependente dele. Não vi muitas iniciativas da Comissão Técnica nesse sentido. Deu no que deu. Não sei se a presença dele faria tanta diferença, se evitaria a goleada, mas valeria a pena ver o que iria acontecer.
• No segundo tempo do jogo conta a Colômbia, quando já ganhávamos de 2 a 0, Neymar estava cansado, levando pancada atrás de pancada e não jogando bem. Eu e outros colegas que víamos o jogo comentamos que seria bom tirar ele de campo, inclusive porque já tinha cartão amarelo e levando pancada daquele jeito poderia se irritar e levar mais um. Não faço ideia se isso passou pela cabeça de Felipão e Parreira. Fato é que ele foi mantido em campo e uma dessas porradas tirou ele do jogo contra a Alemanha.
• Em todas as versões para as causas da derrota em 1950 para o Uruguai, na Final, se fala da comemoração da vitória por antecipação como um fator decisivo para o Brasil ter perdido aquele jogo. Criou um clima de já ganhou, teve festa comemorativa na véspera da Final, discurso do prefeito antes do jogo dizendo que o Brasil já tinha ganho a Copa, e isso pesou sobre os jogadores em campo, principalmente depois que sofreram o empate e, em seguida, o gol vencedor. Agora, em 2014, Parreira, um mês antes da Copa, disse em alto e bom som para toda a imprensa que o Brasil não só era o favorito como seria o campeão. Felipão depois entrou nessa onda. Ignorou-se solenemente uma lição histórica. Quem tem segurança que vai ganhar não precisa alardear isso aos quatro ventos. Esse era um sinal de fraqueza e insegurança ao qual se deu pouca atenção.
• O emocional da equipe chamava a atenção de todos. Um capitão que chorava, que não tinha estabilidade emocional para bater penalty, um grupo de jogadores que entrava em campo com a mão sobre o ombro do companheiro, como se fossem colegiais de antigamente, numa atitude que nenhum outro país precisou adotar, denotando para a opinião pública que, se precisavam tanto estar unidos dessa forma simbólica, era porque algo de anormal estava acontecendo. Além disso, a seleção não tinha um líder dentro de campo, nunca teve. Um líder poderia ter atuado para segurar a onda quando começou a blitzkrieg de gols alemães. A TV mostrou muito rapidamente o Fred, no meio do campo, ao dar a saída de bola após um dos gols, se não me engano o terceiro, dizer para os companheiros próximos: "Vamos acalmar...". Mas ele disse isso quase sussurrando, meio tímido. Um líder, tipo o Gerson, o Dunga, o Pelé, o Cafu, iria berrar e dar esporro geral ali. Mas não tínhamos esse líder em campo. Tínhamos, sim, um bando de jovens e alguns poucos veteranos que não assumiam esse papel de líder. E pelo jeito a Comissão Técnica pouco se importou em formar líderes. Deu a braçadeira de capitão a um excelente jogador, um cara querido e respeitado pelos colegas, mas que não tem a característica, o perfil de uma liderança.
• Em nenhum momento, ao longo dos jogos, se viu o time melhorar por conta de alguma estratégia ou mudança do treinador. Melhorou contra a Colômbia, depois daquele vitória sofrida nos penalties, que levantou o moral e acordou o time.
Sinais não faltaram, alertando que tínhamos muitos problemas e fragilidades para ganhar esta Copa. Como agravante, a Alemanha estava num dia inspiradíssimo para aproveitar nossas fraquezas. Só não foi 9 a 1 porque Júlio César salvou dois gols certos no segundo tempo.
Porém, até onde sabemos, a Comissão Técnica, Felipão e Parreira à frente, não deram valor suficiente aos alertas e não agiram para mudar as coisas. Falou mais forte a teimosia e a arrogância típicas de nossos treinadores, que odeiam ser criticados e ter que encarar seus erros e fazer mudanças que expõem suas dificuldades, limitações e fraquezas.
Acho que nós, torcedores, movidos pelo desejo apaixonado de ganhar a Copa do Mundo e estimulados pelas declarações otimistas de Felipão, Parreira & cia., reverberadas pela imprensa, também não demos a devida atenção aos sinais de alerta.
Pronto, deu-se a derrota mais vergonhosa do futebol brasileiro, em nossa própria casa. E pouco adianta agora dizer "eu bem que avisei...", "eu sabia...". Eu tinha essa teoria toda que expus aqui e também me empolguei, achando que iríamos ganhar. O importante é aprendermos, tirarmos lições para o futuro, os próximos desafios. E não repetirmos os erros.
Vivendo e aprendendo. E vamos em frente. Com a maior cara de mico... fazer o que... um dia é da caça, outro é do alemão.